Em A mobilidade Warao no Brasil e os modos de gestão de uma população em trânsito Marlise Rosa nos (re)apresenta a fatos fundadores das Américas. Deslocados de seus territórios de origem na Venezuela dentre outras razões pela intervenção colonial interna voltada para a exploração petrolífera, os Warao tecem um amplo mapa de trajetos, práticas e modos de pensar que põem a nu a artificialidade da divisão política em Estados surgidos das invasões europeias.
A presença warao no Brasil, sua mobilidade e dispersão territorial – simultâneas à permanente conectividade com seu território originário (por meios como as redes sociais e o whatsapp), com as suas redes familiares e de aliados presentes em distintos estados – elaboram uma vida em trânsito. Mantêm-se como uma coletividade móvel, contrariando os ditames de Estados nacionais crioulos que se pautam pela lógica da fixação espacial de indivíduos e comunidades.
O verniz multi/pluricultural de nossas instituições descasca, estampa-nos a epidemia de COVID-19. Numa leitura a contrapelo, vemos os desvãos das políticas imigratórias, indigenistas, sanitárias: os Warao são imigrantes, venezuelanos e indígenas. No cenário em que vivemos esses três termos têm pesos muito específicos.
Agentes sagazes de seus destinos, por mais duras que sejam as situações que enfrentam, os Warao nos ensinam que a "aldeia" da/o etnógrafa/o se espalha por espaços geográficos, físicos e virtuais os mais variados. Entendê-la demanda conhecimentos que vão desde os tradicionais estudos de parentesco e cosmologia, aos de políticas públicas, ou da ação da cooperação internacional. Texto mais que oportuno, necessário e inovador.
Antonio Carlos de Souza Lima
Museu Nacional/UFRJ
Marlise Rosa é bacharela em Ciências Sociais pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), mestra e doutora em Antropologia Social pelo Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social do Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro (PPGAS/MN/UFRJ). Pesquisadora vinculada ao Laboratório de Pesquisas em Etnicidade Cultura e Desenvolvimento (LACED), na mesma instituição. Tem experiência de pesquisa e atuação junto a povos indígenas em contextos urbanos e em situação de deslocamento e migração.
SUMÁRIO23 Introdução
38 Redes migratórias Warao: dos deslocamentos internos aos movimentos transfronteiriços
41 A mobilidade Warao no contexto das migrações internacionais
50 Tecendo chinchorros e relações sociais: sobre a entrada no campo e as condições da pesquisa
59 Organização dos capítulos
65 Reconstruindo percursos, eventos e narrativas
67 Os Warao
79 Situações históricas de intervenção no território de origem
93 Epidemia de cólera
98 Migração para as cidades
104 Instituição da "prática de pedir"
110 Contexto recente: epidemias, comércio ilegal de alimentos e contrabando de gasolina
117 Conclusão do capítulo
121 Indigenismo e política indigenista na Venezuela
122 2.1 Indigenismo de dominação e indigenismo de libertação
133 O culto a Guaicaipuro no projeto bolivariano
141 Consolidação dos marcos jurídicos sobre os direitos indígenas
147 "Hay que ser firme a la hora de defender a la Pachamama": impasses ideológicos e legais na demarcação de terras indígenas
153 Experiências de autodemarcação
155 Conclusão do capítulo
167 Tecnologias de governo: mapeando agentes,ações e instituições
169 Instituições e agentes da governamentalidade
207 Papéis, documentos e burocracias
212 Na Campina e no Ver-o-Peso: situações de abandono e de esquecimento na capital paraense
221 Conclusão do capítulo
225 Fechando o cerco institucional: modelos de abrigamento
226 Estrutura e direção dos abrigos: experiências de Manaus e de Belém
266 Estratégias de controle: "pacificações" contemporâneas
273 Sobre os modos de ser Warao: quem pode morar com quem
285 Conclusão do capítulo
299 Percepções e reações dos Warao à pandemia de Covid-19
305 Referências Bibliográficas
321 Apêndices e anexos
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