O Rio suburbano é polifônico, pulsante e dotado de uma beleza e uma criatividade ímpares, principalmente em suas efervescências culturais. É o baile Charme, o Jongo da Serrinha, a Feiras das Yabás, a feijoada na quadra da Portela e tantas outras.. É esse Rio que vai se descortinando à medida que o trem se afasta da Central do Brasil que me motivou a querer saber mais sobre as peculiaridades inerentes a essa área da cidade, principalmente Madureira, considerada pelos moradores do bairro o coração simbólico da Zona Norte e que sintetizaria a essência do subúrbio.
Quando ingressei no doutorado, idealizava fazer uma análise de conteúdo das publicidades do então governo do prefeito Eduardo Paes (2009-2016) para entender o porquê de as peças revelarem um Rio mais real, com destaque para as referências a Madureira.
Convencida pelo meu orientador, professor João Maia1, a buscar algo mais instigante e focado na cultura do bairro, decidimos enveredar pela escola de samba Portela, cuja simbiose com o bairro é evidente. Afinal, é praticamente impossível falar de Portela sem falar de Madureira e vice-versa. O nosso objetivo era fazer uma etnografia, por meio da observação participante, sobre os usos – ligados ou não ao samba – que se fazem da quadra da escola. Respiramos quadra da Portela por um ano.
João e eu havíamos encontrado um corpus riquíssimo e que certamente renderia uma investigação bastante interessante. A quadra me agradava, mas comecei a perceber que faltava algo à pesquisa. Por mais que eu tentasse me aproximar das pessoas que frequentavam tais eventos, não as sentia muito receptivas. Geralmente eram monossilábicas e essa resistência poderia se tornar um problema no decorrer das idas a campo.
Em dezembro de 2017, o estudo assumiu uma nova perspectiva quando João, por meio de um programa de TV, conheceu a Feira das Brecholeiras, que funcionava embaixo de um viaduto, em Madureira, bairro que sempre me encantou. João achou que a feira renderia uma análise interessante. E ele estava certo.
O fato de ser uma feira de brechós – "brecholeiras" é uma junção de sacoleiras e donas de brechós -, que comercializa essencialmente artigos de segunda mão, evidenciava o evento como um local interessante para se fazer uma pesquisa com foco em comunicação. Estudar essa relação entre compradores e objetos que pertenceram a outras pessoas e que passarão a contar a história de outros indivíduos também nos interessava, assim como a percepção de um espaço de moda. Essa pluralidade de imaginários revelou-se bastante rica, principalmente por se tratar de uma feira no subúrbio, área da cidade, como dito anteriormente, que normalmente ganha o destaque quando se fala em samba ou se reforça o estereótipo de cidade violenta.
1 O professor doutor João Luís de Araújo Maia foi o orientador da tese (que deu origem a este livro) até o seu falecimento, em outubro de 2018. A partir de janeiro de 2019, o trabalho passou a ser conduzido pelo professor doutor Ricardo Ferreira Freitas.
SUMÁRIOSumário
7 INTRODUÇÃO
1
20 A CIDADE E SUAS CONFIGURAÇÕES
25 Paisagem, espaço e lugar
27 Territórios, territorialidades e multiterritorialidades
31 Cidade, economia e criatividade
41 Rio de Janeiro: da beleza ao caos
2
57 BRECHÓS, TROCAS, DÁDIVAS E SOCIABILIDADE
63 Imaginários e estereótipos dos brechós
69 A moda e o brechó
82 Consumo de roupas usadas
94 Dádivas na modernidade
103 As trocas nos pequenos e médios eventos espalhados pela cidade do Rio de Janeiro
108 As feiras e a sociabilidade
116 Comunicação, consumo e sociabilidade
3
118 A FEIRA DAS BRECHOLEIRAS E O CONSUMO DE ARTIGOS USADOS
125 O início
129 O apoio da CUFA
138 A Feira e o discurso em torno do consumo sustentável
144 Brecholeiras Card, aplicativo e outras coisitas mais: a criatividade na feira
147 Consumo, sororidade, empatia e sociabilidade na Feira das Brecholeiras
156 As redes sociais das brecholeiras
171 CONSIDERAÇÕES FINAIS
181 REFERÊNCIAS
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