Novos Rumos para a Economia Fluminense
Oportunidades e Desafios do Crescimento do Interior
Lia Hasenclever, Yves-A. Fauré e Romeu e Silva Neto (orgs.)
O livro que se
tem o prazer de propor ao público constitui mais um passo no caminho
do conhecimento das condições tanto das oportunidades quanto
das restrições do desenvolvimento local do Estado do Rio
de Janeiro, alguns estudos mais gerais e outros mais setoriais, envolvendo a
escala municipal em quatro das cidades fluminenses: Campos dos Goytacazes, Macaé,
Nova Friburgo e Itaguaí. Neste sentido, a obra deve ser encarada como
um novo desdobramento dos livros anteriores voltados ao mesmo tema: Yves-A.
Fauré e Lia Hasenclever (org.), O desenvolvimento local no Estado
do Rio de Janeiro; Quatro estudos exploratórios no interior fluminense,
Rio de Janeiro, Editora E-Papers, 2003; e Yves-A. Fauré e Lia Hasenclever
(org.), O desenvolvimento local no Estado do Rio de Janeiro. Estudos avançados
nas realidades municipais, Rio de Janeiro, Editora E-Papers, 2005. É
também um dos resultados do Projeto de Pesquisa Estudo Comparativo
de Experiências de Desenvolvimento Econômico Local no Brasil,
financiado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
e pelo Institut de Recherche pour le Développement, instituto de pesquisa
público francês (Processo CNPq no 690015/2004-6) e realizado pelo
Instituto de Economia, da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
A presente publicação,
contudo, não é uma simples continuação das análises
precedentes, através da segunda fase do Projeto de pesquisa. Além
dos esforços visando uma apresentação atualizada dos dados
multissetoriais das realidades e das evoluções dos quatro municípios
já estudados, este novo livro, vale-se de novos estudos realizados por
parcerias competentes e está composto de monografias inéditas
visando completar a paisagem do desenvolvimento na escala municipal, insistindo
ora sobre novas condições favoráveis, ora sobre obstáculos
ou contradições persistentes. Estas parcerias indicam a contribuição
de monografias, teses e trabalhos de pós-doutoramento conduzidos pela
equipe de pesquisa junto ao corpo de alunos deste Instituto. Entre os contribuintes
destaca-se Romeu e Silva Neto, Paula Nazareth, Isleide Zissimos e Débora
Duque Estrada. O primeiro realizando o seu pós-doutoramento no tema,
mediante a publicação destas monografias, e também co-organizador
deste livro.
Em relação
ao tema desenvolvimento local, é importante ressaltar que
a abordagem acadêmica, ou pelo menos criteriosa da questão, não
deveria dar livre curso a uma espécie de exaltação ideológica
das condições de proximidade, da convivência territorial
ou comunitária, das potencialidades de crescimento e de prosperidade
na escala exclusivamente municipal. De fato, reconhece-se a forte influência
dos fatores de desenvolvimento relacionados a outros níveis de realidade
e de ação (regional, estadual, nacional, internacional). Erro
trágico e enganoso seria ignorar os condicionantes supralocais das
trajetórias municipais a despeito das boas vontades e do compromisso
das autoridades nesta escala e avançar às cegas nesta trilha.
De outro lado,
temos de reconhecer que as transformações e as mudanças
observadas em diferentes áreas políticas, administrativas,
financeiras, econômicas, sociais, educacionais e culturais, etc.
ao longo das últimas décadas modificaram tanto a visão
do desenvolvimento, até então, sobretudo tratada a partir do desempenho
do Estado central ou dos contextos regionais, quanto às condições,
incluindo ferramentas e oportunidades da dinâmica institucional e socioeconômica,
dentro dos municípios.
Estas modificações
foram bastante detalhadas e apresentadas como um novo paradigma de pensamento
e de ação de abordagem do tema, nas publicações
anteriores, e, portanto, não se pretende pormenorizá-las de novo.
O municipalismo, consagrado pela Constituição de 1988, a descentralização
industrial plantas e empregos destacada pelos dados do IBGE e
explicada pelos estudos de economistas e demógrafos, a abertura externa
do sistema produtivo nacional e a sua inserção na troca globalizada
que favorece o contato direto das empresas com os seus clientes tanto no mercado
interno quanto no externo, aumenta a concorrência entre territórios
que se tornam cada vez mais especializados, os numerosos programas de apoio
à adaptação das empresas e à modernização
dos aparelhos produtivos, as crescentes cobranças de vários setores
organizados da sociedade civil junto aos representantes eleitos etc., abriram
um espaço para as iniciativas proativas na escala local.
A estas considerações
fundamentais já explicitadas, poder-se-ia acrescentar algumas informações
mais recentes que reforçam esta idéia segundo a qual existem no
quadro local ou municipal potencialidades que podem, se mobilizadas, se tornar
alavancas do desenvolvimento eventualmente combinadas às demais
intervenções de outras escalas de decisão e de atuação.
Os últimos dados do período 2002-2005 do Produto Interno Bruto
(PIB) dos municípios brasileiros mostram que, apesar da persistente concentração
geoeconômica nos estados do Sul e Sudeste do País, e do peso preponderante
das cinco capitais (São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília, Curitiba
e Belo Horizonte) representando ainda 25% do PIB nacional , vários
municípios, com tamanhos inferiores e localizados no interior dos estados,
conseguiram importantes ganhos em relação aos anos anteriores
(segundo IBGE, Produto interno bruto dos municípios 2002-2005,
Série Contas Nacionais, no 22, Rio de Janeiro, 2007).
É possível,
como já se tentou identificar e analisar, que algumas condições
recorrentes e diferentes dos fatores estruturais possibilitem ou, ao contrário,
dificultem o desenvolvimento local. No plano acadêmico, seguem-se certos
avanços na procura de uma teoria neste domínio. Mas, na medida
em que pontos cruciais que desencadeiem ou impeçam a dinâmica socioeconômica
dependem de peculiaridades in situ, tanto qualitativas quanto quantitativas,
tanto pessoais quanto organizacionais, tanto subjetivas quanto objetivas, e
na medida em que as experiências formam um panorama extremamente diversificado,
como já foi descrito em Yves-A. Fauré e L. Hasenclever (org.),
Caleidoscópio do desenvolvimento local no Brasil. Diversidade das
abordagens e das experiências, Rio de Janeiro, Editora E-Papers, 2007,
não existe uma receita geral e prévia a ser implementada para
fabricar o desenvolvimento local.
É justamente
esta característica teórica frágil, feita de incerteza
e instabilidade, que mostra os artigos compondo o presente livro. Não
só as condições de desenvolvimento dos municípios
bases produtivas, contextos institucionais, atuação das
lideranças etc. apresentam enormes contrastes, mas também
aqueles que se beneficiam de condições favoráveis enfrentam,
ao mesmo tempo, grandes dificuldades. Isso indica claramente que o caminho do
desenvolvimento local não é uma rodovia bem asfaltada e linear,
mas sim uma pista repleta de buracos e de curvas, bem semelhante ao estado das
estradas brasileiras atuais. Se ele não justifica um entusiasmo ingênuo
que caracteriza às vezes os atores e os militantes do estudo do local,
pelo menos cabe aos analistas favorecer o progresso no conhecimento do tema
e provar que existem certamente oportunidades de desenvolvimento na escala local.
Esta responsabilidade é um dos objetivos dos artigos a seguir.
O livro está
organizado com uma introdução e quatro partes. A introdução
traz a moldura sobre o desenvolvimento do Estado do Rio de Janeiro e de suas
finanças municipais, mostrando dois aspectos cruciais das teses aqui
defendidas. Em primeiro lugar o interior tem se desenvolvido mais do que a capital
e em segundo lugar as finanças municipais, mesmo com o aumento de sua
disponibilidade devido aos royalties e às participações
especiais, ainda são insuficientes para financiar o desenvolvimento local,
seja devido a sua distribuição territorial desigual, seja devido
à falta de qualidade, planejamento e parcerias na aplicação
dos recursos. As demais partes estão organizadas em torno dos quatro
municípios Campos dos Goytacazes, Macaé, Nova Friburgo
e Itaguaí. Em cada uma destas partes, apresenta-se um acompanhamento
atualizado da situação econômica local de cada um dos seus
municípios, os novos projetos e a capacidade destes novos projetos resolverem
os desafios de desenvolvimento local levantados nas publicações
anteriores. Segue-se uma ou duas monografias sobre algum aspecto específico
do município estudado. Em Campos dos Goytacazes, estuda-se o caso do
Fundecam, um fundo público criado para financiar o desenvolvimento local
a partir das receitas do petróleo. Em Macaé, o destaque vai para
os impactos socioeconômicos que a instalação da cadeia de
petróleo traz consigo. Em Nova Friburgo são examinadas as novas
condições de organização das empresas e do trabalho
decorrentes da nova especialização produtiva em vestuário,
ali instalada a partir da segunda metade dos anos 80, e a cooperação
informal entre as empresas de confecção. Em Itaguaí, examinam-se
os desafios da construção das infra-estruturas para o seu desenvolvimento
local.
Os organizadores esperam mais uma vez, a partir de estudos de casos singulares, estarem proporcionando aos leitores revelações de estudos vivenciados que ilustrem pontos universais sobre o estudo do desenvolvimento local.
Yves-A.
Fauré,
Lia Hasenclever e
Romeu e Silva Neto