Trânsito como eu o entendo
A ciência da mobilidade urbana
O amigo Celso
Franco se destaca entre os diretores de Trânsito com quem tive a oportunidade
de conviver pela sua compreensão abrangente da temática urbana.
Diferentemente de muitos profissionais da área que reduzem o disciplinamento
do trânsito a medidas punitivas ou focadas unicamente no automóvel,
seu olhar humanista enxerga o fundamental: o trânsito como parte da questão
mais ampla que é a mobilidade.
As cidades, essa
fantástica expressão do gênio humano, têm sido objeto
da minha atuação profissional há quatro décadas,
e na busca constante de soluções para a melhoria da qualidade
de vida de seus habitantes e tendo a mobilidade como um princípio basilar.
Assim, o retrato
abrangente e objetivo que Celso Franco traça do tema agrega ao debate
uma contribuição de grande valia, ao abordar de maneira contundente
aqueles pontos que a meu ver são fundamentais ao equacionamento da questão,
e que têm uma interface bastante estreita com outra questão de
grande visibilidade do contexto urbano que é a sustentabilidade.
A cidade é
uma estrutura de vida e trabalho, e esta deve estar refletida em seu desenho.
O rendimento da malha viária será invariavelmente comprometido
se esse binômio forçar grandes deslocamentos dentro da trama urbana.
Morar perto do trabalho ou trazer o trabalho para perto de casa é
um princípio tanto de mobilidade quanto de sustentabilidade.
Outro aspecto
fundamental levantado trata da necessidade de oferecer ao cidadão opções
de como se locomover pela cidade, e do imperativo para a melhoria da mobilidade
de se investir em transporte coletivo de qualidade, confiável, permitindo
auferir importantes ganhos sociais e ambientais, e reduzir a utilização
do veículo particular para os deslocamentos urbanos.
Mobilidade e sustentabilidade
compartilham também uma dimensão temporal. Em um contexto no qual
se buscam alternativas de matriz energética menos onerosas para o meio
ambiente, em que cada minuto do dia é precioso, o desperdício
de tempo e de energia representado por congestionamentos e engarrafamentos faz
da otimização da fluidez uma questão premente. Nesse quesito,
conforme o autor coloca, aspectos de desenho como uma hierarquização
clara do sistema viário, boa sinalização, e a utilização
de tecnologias de controle de trânsito têm importante papel a desempenhar
na racionalização do sistema.
Cabe ressaltar
ainda, sem exaurir o assunto, a ênfase que o autor coloca na articulação
da mobilidade e segurança. A mobilidade urbana abrange não só
veículos motorizados com suas infra-estruturas e tecnologias compatíveis,
mas também pedestres e ciclistas, que se vêem freqüentemente,
ao se deslocar pela cidade, participando de uma corrida de obstáculos
na qual arriscam a vida. A importância da educação para
o trânsito, em particular das crianças, é crucial para que
se atinja uma maior civilidade e segurança no trânsito.
Trânsito como eu o entendo reflete o profundo domínio teórico e prático de Celso Franco sobre a questão da mobilidade urbana, e traz uma contribuição valiosa não só aos que pensam as nossas cidades, como aos que as geram ao retratar, de forma clara e precisa, que a mobilidade advém da interação equilibrada de todos os que compartilham a Cidade, suas respectivas necessidades de locomoção e o território.
Jaime
Lerner
Arquiteto e urbanista.
Por três vezes prefeito de Curitiba, governador do Paraná, em duas
gestões e, atualmente, presidente da União Internacional de Arquitetos.