Manifestos Políticos
O primeiro volume
desta coletânea de manifestos obedece ao critério do espaçamento
e da representatividade política relativamente ao período da História
do Brasil republicano. Por espaçamento entende-se a distribuição
desses documentos ao longo do período que se estende do ano de 1870,
quando o desejo de república torna-se manifesto, até os anos da
ditadura militar (1964-1985). Do último quarto do século não
há nenhum registro em razão de fatos de grande relevância
terem sido veiculados por meios crescentemente eletrônicos, sem a característica
marcante dos que haviam sido editados e tornados públicos por intermédio
de meios impressos, como os periódicos e os panfletos.
Quanto à
representatividade este critério elegeu os manifestos de repercussão
mais aguda, seja para a época em que foi lançado ou pelos desdobramentos
que proporcionaram. Mesmo se tratando de uma avaliação subjetiva,
o princípio de representatividade contempla efetivamente a relação
entre tais documentos e os fatos dos quais se originaram ou deles produziram
seus efeitos. Geralmente vinculados aos episódios de grande relevância
histórica, esses manifestos independem de uma avaliação
mais conclusiva tendo em vista a absoluta pertinência no trato desses
fatos significativos da República.
Concebidos e escritos
em diferentes momentos da vida nacional brasileira, os manifestos aqui arrolados
e apresentados pelos colaboradores dessa obra coletiva, possuem características
próprias e um traço comum. Em relação às
características coube aos que deles se ocuparam tratar. Quanto ao traço
comum caberia uma ligeira explicação, cujo elemento mais destacado
é o fato de terem sido expressões de mudanças comportamentais
de seus autores em face dos problemas e dos desafios que ensejaram à
produção desses documentos históricos. Portanto, todos
independentemente de sua relativa importância de acordo com o olhar
que sobre eles se lança foram manifestos de grande alcance na
sociedade e, por isso mesmo, provocaram reações também
de forte significado.
Personagens irmanados
ideologicamente aos seus pares, organicamente ou por meio de simples empatia,
os autores desses manifestos fizeram história, e muitos deles tornaram-se
referência em razão das idéias contidas nos dizeres dessas
expressões políticas a varrer os tempos e as gerações.
Tanto quanto os documentos institucionais ou meramente comuns, os escritos políticos,
que aqui designamos por manifestos, dão à história manuscrita
um sentido bem distinto daquela que se apura e se constrói mediante o
emprego de fontes orais e consuetudinárias. E tal evidência se
dá não apenas pela presença da escrita, mas pelo caráter
sistemático, lógico e, muitas vezes pelo sentido teleológico
que se insere no contexto dos textos que lhes dão forma e significância.
O que definitivamente
confere a esses documentos o sentido de manifestos é, sobretudo, o sentido
de traduzirem demandas necessariamente coletivas e inspiradas em projetos políticos,
cujo alcance pode ter sido bastante significativo à época em que
foram difundidos. Todavia, a distância do tempo em que foram veiculados,
ainda guarda um sentido histórico, capaz de ajudar o leitor a entender
o por quê de sua existência. É por essa razão que
nem sempre todos foram transcritos na íntegra, seja porque o importante
era a mensagem que comunicavam, seja pela impossibilidade de tê-los com
segurança por completo. O que vale nesses casos são sempre os
dizeres essenciais, aqueles que remetem aos postulados e concepções
necessariamente ideológicos.
Do conjunto de
manifestos reunidos nesta coletânea há os que se notabilizaram
por estenderem sua influência à sociedade e às instituições,
de modo a produzir efeitos imediatos ou mediatos nas relações
sociais e também na vida política e institucional do país.
É o caso dos que se constituíram propriamente dito em manifestos
de cunho eminentemente voltados para o espaço da política, tais
como o dos republicanos históricos, o dos políticos mineiros da
década de 40 e o que sintetizou o drama pessoal e político de
um governante, Getúlio Vargas, e o de uma nação envolta
numa crise de implicações não resolvidas senão cerca
de 10 anos depois e mesmo assim através de uma nova forma de tensão,
que foi o golpe de 64. Nesses casos, a matéria-prima desses documentos
foi essencialmente a política no que ela tem de fundamento ideológico
e doutrinário e de ações coordenadas direcionadas para
um determinado objetivo.
Mas há
os manifestos que se situam no âmbito de teses ou bandeiras ou ainda de
movimentos de opinião, de cujos alcances tiveram maior ou menor intensidades
de acordo com os momentos históricos. Neste sentido, alguns podem ter
se constituído em manifestações de curto a médio
prazos, e outros provocaram reações de tempo mais dilatado em
função de circunstâncias que a própria captação
histórica e historiográfica conseguiram produzir. Podem ser considerados
os manifestos setoriais indistintamente localizados no campo da educação,
saúde pública ou das forças armadas, das artes e da literatura
ou no da trajetória de partidos políticos a traçarem rumos
novos ou diferentes às práticas sociais que até então
os orientavam.
Por fim cabe um
esclarecimento adicional. O leitor por certo notará a ausência
de alguns manifestos que facilmente se enquadrariam nos critérios mencionados
acima. Essas ausências não se devem a escolha pessoal do organizador,
mas a impossibilidade de se substituir colaboradores cuja presença neste
primeiro volume não pode se concretizar em razão do prazo estipulado.
Contudo, esses mesmos colaboradores, em sua maioria, já se encontram
engajados para o próximo livro dos manifestos, quando então, certamente,
essas lacunas serão sanadas.
Lincoln de Abreu Penna.